Vai me largar? Por um gay ou por um hétero?
























Ser largado, dói, claro - e não tente amenizar com aquele "foi uma decisão dos dois". Alguém quase sempre toma a iniciativa e o outro fica sem ter muito o que fazer para mudar aquilo, ou seja, foi largado, sim! Supera! E o lance é esse: superar. Como? 

São precisos muito desapego e sangue frio para simplesmente entender que o relacionamento acabou e tocar a vida - e nem sempre há em que se apegar para compreender os motivos da outra pessoa, muitas vezes nem mesmo se o outro for um palestrante e deixar bastante claro quais foram as suas razões a pessoa está disposta a entender.

E quanto menos explicações desenhadas em papel e embasadas em histórico de posts nas redes sociais, maior a chance de quem for largado achar - na verdade ele tem certeza - de que existe outra pessoa no esquema. "Conheceu alguém e não quer me contar"; "Eu sabia que aquele cara era mais que primo distante" ou "Deve ser aquele ex que vinha com aquele papo de que eles seriam sempre amigos em nome da história que tiveram! Só pode ser isso! Eu sei que é isso!".

Nem sempre há outra pessoa. Mas... Quando há... E se for um outro ou uma outra que não ofereça bem o sexo, na verdade, o gênero que você oferecia? Para colocar em cartilha psicopedagoga: se seu marido hétero te deixa por outro homem, sua esposa gay te deixa por um homem hétero e assim vamos com todos os derivados de um relacionamento? Como você fica? Melhor ser largado por um semelhante seu ou, digamos, por "uma outra pegada"?

Perguntei para algumas amigas héteros e a coisa se divide. Há quem diga que prefere ser largada pelo marido para ele ficar com outro homem. "Eu prefiro assim porque pelo menos tenho a certeza de que não teria como competir com aquilo, não teria nada para fazer contra. Seria mais fácil pra mim" - Manu, pouco mais de 30 anos, linda, segura e bem resolvida em (quase) tudo (afinal, ela é mulher, então nunca será bem resolvida em tudo. Rá!). Outras meninas me falaram que ficariam muito chateadas, que matariam o cara e o novo namorado dele. Surtadas. Mulheres.

Eu estou com a Manu. Eu, gay, num relacionamento há quase dois anos, prefiro que meu namorado me largue para ficar com uma mulher. E se vier com pacote "Fodeu por Completo" do tipo casamento na igreja, família no modelo antigo e filhos, melhor para mim - porque, além de eu não ter vagina, não sou deste estilo de vida, então vai ser feliz!

Loucura assimilar isso desta forma ou o ápice da compreensão de que contra algumas coisas não há o que fazer? Há dez anos namorei uma menina. O namoro durou três anos. No último ano ela encasquetou que queria casar. Fez carta de crédito para comprar apartamento e começou o enxoval. Ainda queria que eu ajudasse nas parcelas do apartamento enquanto eu mal conseguia pagar a minha faculdade. Terminamos. Disse a ela que não poderia oferecer o que ela queria. Eu sabia que era gay - sim, a gente sabe desde criança o que nos atrai, então para de falar que fulano "virou" gay. Mas não achava que relacionamento gay era uma opção. Enfim! Mesmo assim não menti quando não podia entrar num casamento porque aquilo não era para mim e continua não sendo - mesmo com um homem ao meu lado.

Meses depois, quando ela soube que sou gay, surtou. Se sentiu traída e sei lá o que mais. Soube por amigos. Quando tentei contato por e-mail explicando como foi tudo, ela simplesmente me desejou que Deus estivesse na minha vida e que O Senhor me guiasse e tudo o mais como se eu fosse o novo Lúcifer. Um e-mail de três linhas para a minha carta do tipo "eu não queria estragar a minha vida e a sua". Hoje ela é casada e tem filhos como sempre quis. Mas definitivamente teria preferido (eu imagino) que eu a tivesse deixado por outra mulher. Louco, né? E eu pensando que ela surtaria se a deixasse e então me casasse com uma garota e fizesse com a outra tudo que não ofereci a ela. Pegou o esquema?

O lance é, independentemente de sermos deixados por outro homem ou por outra mulher, gay ou hétero, é sempre bom conseguirmos entender, sim, o motivo da outra pessoa e, não, não acredito que ela não tenha um - ou alguns - motivo. Não me venha com "Ah, não tem uma razão, não sei o que aconteceu...". Tem sim, gente! No mínimo, a vontade, o amor ou o tesão acabou. E isso já é motivo. Pois as coisas mudam. E algumas mudam sem termos interferência alguma. Por qualquer que seja, ter algo para se apegar ajuda. É necessário, arrisco. E caso não haja ou não consiga ser entendido, há sempre nós mesmos para amar e seguir a vida nem que a gente mesmo tenha que inventar os motivos para termos sido deixados. Afinal, o passado nada mais é que uma versão da história que contamos para nós mesmos.


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