Quem sobrevive

Há tempos percebo isso e a cada dia me convenço mais: as pessoas não sabem lidar com opções


Desde o filme “Dançando no Escuro” não assisto a algo tão perturbador. Enquanto no longa dos anos 2000 Lars von Trier explora a crueldade do ser humano em tirar proveito e prejudicar outras pessoas, o filme “Homens, Mulheres e Filhos” (2014) – do diretor de “Juno” e “Amor Sem Escalas”, Jason Reitman – veio disfarçado de comédia, com título extremamente comum e me surpreendeu com o drama sobre como essa nossa espécie tem o dom de fazer mal a si mesma, ainda que individualmente, especialmente com o uso das novas tecnologias.

Ponto para a cena em que o menino, sozinho em seu quarto, troca mensagens com a menina se insinuando sexualmente enquanto a garota retribui – supostamente no mesmo clima que ele – caminhando pelo shopping com a sua mãe sem dar a menor moral para o coitado. Para coroar, a sequência rola ao som de “I Feel Love”, da Donna Summer.

E você, sente o amor? Quando sente, quer saber o que mais poderia sentir. Quando está fora, quer saber o que há dentro. Quando confortável, pula todas as cercas para ver como está ali fora. E sempre juramos não ir muito longe. Para tudo isso, quer incentivo melhor que a tecnologia? Atualmente existe site especializado até em relações extraconjugais.

O que dá para ser feito? Dá para simplificar. Filtre o que te serve ou não. Não, não se pode ter tudo. Já ouviu isso? Pois é. Ao menos não o “tudo” que há no cardápio de hoje. E, sim, dá para ser feliz sem aquele “excessinho” que você quer tanto experimentar.

Há tempos percebo isso e a cada dia me convenço mais: as pessoas não sabem lidar com opções. Afinal, como diz o cartaz do filme “Todos estamos à procura de uma conexão melhor” – no trocadilho entre internet e relacionamento.

Falamos sobre promover o diálogo, as conversas com maturidade por conta de tanta informação exposta para todo o mundo atualmente e o que fazemos? Um casal de meia-idade acha que o caminho é dizer “abertamente” que está sentindo falta de sexo e então marcar o dia para transar em vez de chegar realmente onde é necessário para resolver “o tal” problema fazendo “o tal” uso da “tal comunicação cabeça aberta” tão propagada nos programas de entrevista.

“Homens, Mulheres e Filhos” mostra dramas familiares que envolvem dos filhos adolescentes aos pais como casal, aos pais como indivíduos. Trata de anorexia à promiscuidade. Tudo com a conturbada mão pesada da tecnologia e suas várias possibilidades sobre a vida que levamos hoje. Da mãe neurótica que rastreia a filha o tempo todo na internet até a gostosinha que vende assinatura de suas fotos em seu site exclusivo, ao adolescente de 15 anos que não tem ereção com uma mulher pessoalmente por tanta exposição à pornografia online.

Só não me senti pior durante as mais de duas horas no cinema porque meu celular estava desligado e eu sinceramente não me importava se alguém tentasse falar comigo naquele meu momento “eu comigo”. Eu ainda tenho salvação! Mas me salvo por pouco.

E as lições do filme são claras: com a internet não há mais como voltar depois de nos expormos; ninguém está imune às novas tecnologias e a maioria não sabe lidar com isso. Portanto, às vezes é simplesmente melhor ignorar o problema do que tentar agir como se tivesse domínio sobre ele, mostra o filme. Mas eu não acho.


Trata-se de uma comédia como apresentada em algumas sinopses? Até é. Tem Adam Sandler, então... Mas, não. Todo esse lance não pode ter graça. Só se for para rirmos de nós mesmos e a situação tosca em que vivemos. Sobrevive quem se impõe alguns limites.



Comentários

Que as realizações alcançadas neste ano, sejam apenas sementes plantadas que serão colhidas com maior sucesso no ano vindouro. Feliz Natal e boas festas!
http://www.luceliamuniz.blogspot.com.br/


Bom novo ano para você, Lu!
Beijão.