É Carnaval

"A bipolaridade como variação de humor das pessoas
é simplificar demais o Carnaval das polaridades humana"


Uma mulher e um homem acabam de se conhecer durante o jantar na casa de um casal de amigos em comum e andam juntos pelas ruas no caminho de volta para seus lares.  “Eu fico aqui”, diz a moça na porta de sua residência. Na sequência, sem rodeios, solta “se quiser, pode entrar e transar comigo assim que apagarmos as luzes”. O cara a rejeita e ela cai aos prantos nos ombros do homem abraçando-o fortemente, dizendo que está carente desde a morte de seu marido.

Esta história aconteceu comigo. Mentira. É cena do filme “O Lado Bom da Vida”. Mas poderia, sim, ter rolado naturalmente comigo ou com você. O longa em cartaz nos cinemas é uma comédia romântica, drama – sei lá qual foi a intenção – que aborda a bipolaridade. Porém, definir nesta a variação de humor das pessoas é simplificar demais o Carnaval das polaridades humana.

No trabalho, uma amiga pediu ajuda à equipe para uma atividade que precisava atender, mas que no momento estava muito ocupada. Em cerca de cinco segundos, ninguém respondeu e então me ofereci.

Ao começar a me explicar o que queria que eu fizesse, começou a chorar e a engasgar nas lágrimas e a ficar vermelha sem conseguir completar uma frase sequer. Quando retomava, passou a ter ânsia de vômito e a dizer que estava com muita dor de cabeça.

Atendi ao pedido pouco antes de ela correr para o ambulatório da empresa. Ela teve um pico de pressão causado por estresse que atacou o seu fígado que a atingiu na cabeça, que a fez ter vontade de vomitar, que por sua vez a deixou com a boca sem cor. Voltou para o escritório e ao começar a contar o ocorrido à supervisora para que esta a dispensasse do trabalho, voltou a começar a chorar, cara vermelha... Já contei.

Outra amiga posta um aviso no Facebook sempre que sua mãe é internada no hospital e atualiza com o quadro clínico quando há uma piora ou melhora.

Nos preparativos para o Carnaval, um amigo me contou que não iria mais à praia, pois a namorada do dono da casa em que ficariam caiu em depressão por uma ansiedade causada pela viagem. É piada pronta: “fiquei triste porque fiquei animada em ver o mar”.

Sim: as pessoas são perturbadas até que me provem o contrário. 

Evitando o programa Fantástico no domingo, zapeei pelos canais até parar em uma reportagem gringa que falava sobre os acumuladores – pessoas que juntam coisas e nunca conseguem se desfazer delas, tornando suas casas verdadeiros depósitos infestados por insetos.

A personagem da matéria, uma “acumuladora”, aparentava ter quase sessenta anos e vivia em uma casa (troca) – depósito (troca) – lixão com seu filho. Deixada por seu marido e o outro herdeiro, ela é psicóloga. Sim, uma profissional da mente e do comportamento que não consegue tirar o lixo do banheiro por não querer se desfazer das coisas (troca) – uma louca (troca) – usa bermuda de cotton na cor mortadela e amarra o cabelo em chiquinha no topo da cabeça.

Depois de vários depoimentos cafonas dublados sobre a tal mulher e a intervenção de especialistas para deixar a casa – e ela – em ordem, o programa acabou com final feliz – até ali – e então começou outro, chamado “Desordem Mental”. Este segundo falaria sobre um homem de meia idade, bem sucedido, que nunca aceitou o fato de ter a perna esquerda e já até havia planejado a altura da coxa em que pretendia amputá-la. 

Não entendeu? Volte e releia atentamente, pois continuo inconformado demais para explicar isso.

No intervalo de mais este show de especialistas, casos bizarros e dublagens sem noção, descobri que se tratava de um canal chamado Home & Health (h&h), um especial da rede Discovery que possui parte de sua programação dedicada aos assuntos: “bem-estar físico e emocional e histórias sobre a realidade em que trabalham e vivem médicos e pacientes”.

Com todas estas referências, meu abre alas nesta sexta-feira de Carnaval foi “O Cinema” e na programação os foliões do meu bloco vão receber as atrações “Meus Livros”, “Aqueles DVDs”, “O Apê Novo de Minha Amiga” e “Programa a Dois com Meu Amor”.

Na televisão, tem folia nos canais abertos e no h&h da TV por assinatura.

Na vida real, tem fantasia e tem alegoria. Mas tudo normal. É Carnaval.




Imagem:
1211-20121011-CrazyBirdBlob
Society6! / Daily Drawing #1211

Comentários

Foi SENSACIONAL, Lucélia!

Espero que o seu também tenha sido. Beijão e bom retorno do feriado.
Francine Ribeiro disse…
Matheus, quando li seu texto não tinha assisto 'O lado bom da vida', fui ver ontem.
Ainda estou inconformada com a indicação desse filme para o oscar de melhor filme e embasbacada com a escolha da Jennifer Lawrence para melhor atriz. Tem coisas que só a Academia faz... Parece que eles nem assistiram 'Amour'...
Bom, quanto ao seu texto (para não pensar que eu sou louca..rsrs), cada dia mais parece que estamos cercados por pessoas descompensadas!
E esses programas estranhos sobre transtornos e desordem são muito sem noção e, na pior das hipóteses, podem servir de estimulo para os desocupados de plantão arranjarem um problema...rs
Bom, acho que já escrevi demais..rs
boa semana pra você!
Oi, Fran. Eu quase fui apedrejado pelos meus colegas quando disse que assisti ao filme e não achei nada de mais rsrsrs. TÃO BOM alguém que compartilhe isso comigo.
E Jennifer Lawrence teve sorte em levar o prêmio. Não assistir "Amor", ma acredito que a tal senhorinha protagonista é quem merecia levar. A falta de opção que colaborou com a Lawrence foi TANTA que havia uma menina de nove anos concorrendo a melhor atriz rsrs. Oremos!

Sobre estes programas, concordo com você pois pode realmente soar um "olha, é normal ser problemático, tanto que a gente já tem até uma programação na TV sobre pessoas como você".

Uma ótima semana e thanks como sempre.